domingo, 15 de dezembro de 2013

da beleza inventada

As cicatrizes viraram estrelas que contávamos todas as noites, felizes. Quantas mais surgiam, mais estrelado o céu ficava e tínhamos a sensação de que estava, afinal, ficando muito bonito com toda aquela luz nova.
Os espaços entre os dedos andavam avermelhados e os nós roxos de socos. Tanta cor, a da olheira, a do sangue no chão do banheiro, a do quebrado do nariz, era tudo muito lindo, superava o próprio arco-íris. Quando achávamos que havíamos completado a palheta, surgíamos com uma cor nova, um esverdeado na pele, por que não?
Os outros não viam muito, preto e branco, talvez. Não entendiam, não achavam graça no mundinho que construíamos para nós. Fazíamos sempre o mesmo esperando um resultado diferente. Era isso, um ciclo, um círculo ante a quadradeza das outras pessoas. Não tínhamos vértices, nem sanidade alguma.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

exploding

(anti)terapia explodingdog:



terça-feira, 18 de junho de 2013

passado.

Quando estou ao seu lado, não me reconheço, é como se fosse outra pessoa, um alguém único - eu me vejo de fora, como um terceiro corpo. Não sei se gosto dessa outra pessoa ou mesmo se o que ela ostenta é calma ou tristeza. Não sei dizer se o ar fica mais pesado ou sou eu que o peso. Não sei se isso é distorção ou conforto. Não sei sequer se me arrependo ou me encontro.

quinta-feira, 13 de junho de 2013

domingo, 26 de maio de 2013

não-sutil

Eu tenho uma mente confusa, sempre tive. Minhas explanações mais lógicas soam inverossímeis ou humorísticas. Não me resta muito a não ser acompanhar o ritmo das risadas, mesmo que internamente haja um turbilhão incessante de pensamentos que insistem para se explicar ou contestar os desentendimentos. Não seria possível, minha sensibilidade soa a insensibilidade ou quase sempre não aparenta existir. Tudo um mais do mesmo, frases repetidas, pessoas similares que posteriormente destoam, um quase sempre... Poucas pessoas me enxergam além do que eu mesma posso ver devido à minha miopia existencial e fisiológica. Há pouco firmava a convicção de que pessoas míopes não são confiáveis, são distorcidas, tendem a distorcer; eu mesma enxerguei manchas por amargos e longos anos. São borrões que carrego na memória, ciente de que os quadros e linhas que defini nunca possuíram aquelas formas e contornos. Daí surge a angustia de saber ter vivido em um mundo que só eu havia criado e compreendido, surge uma solidão tardia e uma impressão de que todos os outros frames poderiam ter sido cortados, é uma ciência retesada e uma velhice precoce. Nem os abusos que sofri dos outros que não me viam doem mais que os abusos que me impus por não me ver. Sinto falta de um longo espelho no quarto, ele teria me feito bem. Eu não desejaria a você, que me compreende, um presente como o meu, uma felicidade desacreditada em decorrência de uma vida pretérita irreal e uma realização que sempre vou temer ser desvaliada. As frases cortadas e agressivas que nos cercam carregam um bem-querer inexplicável. A todo o tempo conto cegamente com a sua percepção das sutilezas e levezas; não se prenda aos borrões, aos "ous", às fúrias e às decepções súbitas. O marasmo acalenta melhor as almas como as nossas e o tédio nos é necessário, porque tem gente demais para comer nossos sonhos.

Imagem: Luke Chueh - Contact Lens

sábado, 9 de fevereiro de 2013

c'est fini.

Eu detesto
a supressão de letras,
a distorção dos sonhos,
a covardia ensaiada.

A arte de detestar,
eu detesto
e domino.
Finito.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

sobre ilhas e joaninhas

Nasceu ilha, bastava-se.
A primeira lembrança que tem é de um pé de anis habitado por pequeninas joaninhas. Lembra da mãozinha estendida e do pensamento de tocá-las, pero foi retesado pela ideia de que não devia tirar-lhes o prazer daquele instante.
Como ilha que é, foi visitada por muitos náufragos; eles chegavam buscando terra firme e com o anseio recorrente de voltar aos seus continentes. Sem se encontrarem, faziam dali seu porto seguro, aprendiam a amar seus subsídios parcos, juravam a si mesmos que viveriam ali para sempre, felizes. Até avistarem um barco e outro e, por fim, um que os levasse de volta com um contentamento mal escondido que lhe rachava o terreno.
Mas não se opunha, eram como as joaninhas, deviam seguir a vida. E assim foi, assim é. Ela é uma ilhota, a qual não ensinaram que é proibido querer ser um continente habitado, com pessoas enraizadas: joaninhas que pousam em seu dedo, sem que ela tenha que cessar o cotidiano de alguém.

Bônus: